Tuesday, August 23, 2016

O pintassilgo

O livro escolhe o leitor. Já tinha lido sobre ele em algum lugar e eis que estava ali, na banca da rodoviária do Rio de Janeiro olhando para mim.
"O absurdo não liberta; amarra." Albert Camus

"Enquanto ainda estava em Amsterdan, sonhei com minha mãe pela primeira vez depois de anos. Já estava trancado no hotel havia mais de uma semana, com medo de ligar para quem quer que fosse ou de sair; meu coração disparava e vacilava com os ruídos mais inocentes: a campainha do elevador, o arrastar metálico do carrinho de minibar, até os sinos de igreja dando as horas, De Westertoren, Kritberg, as badaladas um tanto sombrias, uma sensação intrincada de morte, saída de um conto de fadas. De dia eu ficava sentado aos pés da cama me esforçando para tirar algum sentindo das notícias em holandês na televisão (o que era inútil, já que eu não sabia uma palavra em holandês) e, quando desistia, sentava perto da janela e ficava olhando o canal com meu casaco de pelo de camelo por cima das roupas- pois eu tinha saído às pressas de Nova York e as roupas que levara não eram quentes o suficiente, mesmo num ambiente fechado." p. 9

Agora o final de arrepiar. Não tô sabendo lidar com tanta beleza:



"O que quer que nos ensine a falar com nós mesmos é importante- o que quer que ensine a sair do desespero ao chamado de um canto. Mas a pintura também me ensinou que podemos falar uns aos outros através do tempo. E sinto que tenho algo muito sério e urgente para dizer a você, meu leitor não existente, e sinto que deveria fazê-lo com tanta urgência quanto se estivesse no mesmo recinto que você. Que a vida- independente do que mais ela seja- é curta. Que o destino é cruel, mas talvez não aleatório. Que a natureza (isto é, a Morte) sempre vence, mas que isso não significa que temos de nos curvar e rastejar diante dela. Que talvez mesmo quando não nos sentimos tão contentes por estarmos aqui é nosso dever mergulhar nisso ainda assim: abrir caminho e seguir em frente, bem pelo meio da fossa, mantendo ao mesmo tempo olhos e coração abertos.E, no meio do nosso morrer, enquanto saímos do orgânico e afundamos ignominiosamente de volta nele, é uma glória e um privilégio amar  que a Morte não toca. Pois, se desastre e esquecimento seguiram essa pintura através do tempo, o amor também o fez. Na medida em que ela é imortal (e ela é), eu exerço um pequeno papel, brilhante e imutável nessa imortalidade. Ela existe; e continua existindo. E eu acrescento meu próprio amor à história das pessoas que amaram coisas belas, e cuidaram delas, e as tiraram do fogo e as procuraram quando estavam perdidas, e tentaram preservá-las e salvá-las enquanto as pessoas passavam literalmente de mão em mão, cantando de forma brilhante pelos destroços do tempo para a próxima geração de amantes, e a próxima." p. 719


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