
Não há, no princípio, nada. Nada. O rio liso, dourado, sem uma única ruga, e atrás, baixa, poeirenta, em pleno sol, como o barranco caindo suave, meio comido pela água, a ilha. O Gato sai da janela, que fica vazia, e procura, sobre as lajotas vermelhas, os cigarros e os fósforos. Agachado, acende um cigarro e, sem sacudi-lo, entre o tumulto da fumaça da primeira baforada, deixa cair o fósforo que, ao tocar as lajotas, de um modo súbito, se apaga. Põe-se de novo à janela: agora vê o Ladeiro, montado precariamente no baio amarelo, com as pernas cruzadas sobre o lombo para não molhar a calça. A água se amontoa contra o peito do cavalo. Vai emergindo, gradualmente, da água, como se avançasse com sacudileas, descontínuas, até as patas finas tocarem a margem.
Durante um lapsto incalculável, a que nenhuma medida se adequaria, tudo permanece, subsiste, isolado e simultâneo, o pelo suave e suado, a mão, a confiança, o alívio, o olhar, o gosto do café, o café, a transparência cinza do ar que envolve, quase que resplendorosamente, apesar do céu baixo e negro, os corpos que latejam monótonos e o vazio que os separa, riscado pelas gotas intermitentes e oblíquas, cada vez mais numerosas, que vêm estatelar-se no chão. Quando as palmas batem, por fim, uma na outra, ecoando, o salva-vidas se vira e começa a descer na direção da praia, o Gato levanta a cabeça, olhando para o portão, o segundo gole de café cobre o primeiro na garganta de Elisa, o baio amarelo começa a sacudir a cabeça sob a pancada de chuva, e o lapso incalculável, tão vasto quanto longa é a totalidade do tempo, que teria parecido querer, à sua maneira, persistir, submerge, ao mesmo tempo, paradoxal, no passado e no futuro, e naufraga, como o resto, ou o arrasta consigo, inenarrável, no nada universal.